Brasil, país de maior número de apreensões da droga da série “Breaking Bad”, metanfetamina.

                                

Artigo  do psiquiatra Pablo Miguel Roig, CRM 24968*

As drogas sintéticas têm ganho um espaço importante na relação de usuários de drogas com seu agente etiológico. Dentre as drogas produzidas em laboratório, a metanfetamina ocupa um espaço de uso de proporções epidêmicas. Apresenta-se como um pó branco e amargo ou em forma de cristal azulado. É uma droga altamente estimulante, que pode ser fumada, aspirada, ingerida ou injetada. Comumente, a droga é conhecida como Meth, Cristal Meth,Cristal, Ice, Speed, Glass,Yaba, Christine, Rebite ou Bola. Assim como outras drogas estimulantes, seu efeito farmacológico é em resposta à liberação importante de dopamina no centro da recompensa de nosso sistema nervoso central, sendo este neurotransmissor o responsável pela motivação e a percepção do sentimento de recompensa e satisfação. Pelo fato de seu efeito ser momentâneo e rápido, a tendência de seu uso, tende a tornar-se compulsivo, para recuperar a estimulação obtida em forma imediata pelo fármaco. Esta característica transforma a metanfetamina numa droga de forte poder adictivo, provocando na suspensão do seu consumo sintomas de abstinência como ansiedade, depressão, sintomatologia psicótica e fissura intensa.

                                                                Cartaz  da  série  “Breaking  Bad”

Os efeitos imediatos das metanfetaminas caracterizam-se pelo aumento da pressão sanguínea, da temperatura corporal, da atividade, a diminuição do sono e da fome e aumento da resistência à atividade física. Estas características foram usadas durante a Segunda Guerra Mundial na procura de obter super-homens nas fileiras do exército alemão, fato magistralmente descrito por Norman Ohler no livro “HIGH HITLER”. O processo de produção e distribuição, também está exposto no seriado “Breaking Bad ”, mostrando a relação desta droga com máfias internacionais, assim como o dano que seu consumo provoca.   Além da relação da droga com o aumento da criminalidade e também de acidentes automobilísticos, a indução a comportamentos antissociais e a evasão escolar, as consequências mediatas, incluem a falta de cuidado dos usuários, pelo fato de terem seu julgamento alterado, colocando-os em risco de contrair doenças infecciosas como HIV, hepatite, sífilis ao não cumprirem com os recursos higiênicos no uso injetável. Também apresentam perda de peso, ansiedade, confusão, insônia, perda de memória, comportamento violento, alterações do funcionamento cerebral, paranoia, alucinações, comichão e sérios problemas na dentição.

A sobredose pode provocar AVC e infarto do miocárdio, principalmente, assim como lesões em outros órgãos.

Os tratamentos para este tipo de patologia, baseiam-se na realização de diagnósticos abrangentes, que observem elementos como: o uso concomitante de outras drogas psicoativas, os danos na estrutura psíquica, assim como a biológica do paciente, a sua estrutura de personalidade e os seus elementos cognitivos e sua situação sociofamiliar. A interação de equipes multidisciplinares e de abordagem múltipla, aumentam significativamente a possibilidade da reabilitação. Deve-se respeitar a abstinência de substâncias psicotóxicas e a manutenção do tratamento pelo tempo necessário. A interação do tratamento psiquiátrico com o cognitivo comportamental, assim como técnicas de ressocialização têm se mostrado eficazes.

Nossa preocupação está também ligada à produção anual de aproximadamente 150 novas drogas sintéticas, com poder destrutivo incalculável e com as misturas que os usuários consomem, sem ao menos saber o que estão incorporando em seu sistema. Os profissionais desta área devemos estar permanentemente atualizados e constantemente nos surpreendemos com a criatividade destrutiva permanente dos produtores e consumidores de drogas. 

Um relatório da UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime), refere que estamos lidando com 350 novas drogas sintéticas no mercado e descreve a abertura de novas rotas de distribuição através de países do oeste da África e o Irã. Também faz referência a que a sua popularidade é facilitada por não terem limitado seu nicho de mercado, podendo ser compradas e vendidas por meios virtuais. Na América Latina, as drogas de maior consumo são ainda maconha e cocaína, não considerando o álcool e o tabaco, mas a metanfetamina vem ganhando espaço significativo e o Brasil e o país de maior número de apreensões da droga.

Temos percebido em nossa atividade terapêutica, que existe uma minimização das consequências do uso destas drogas sintéticas e que os usuários tendem a não as considerar substâncias que provoquem dependência assim como o álcool, a cocaína e o crack. Isto dificulta o tratamento, mesmo em indivíduos que já há tempos perderam o controle de uso, assim como nos impede atuar com os pacientes, através de processos de prevenção secundária. Trata-se de um desafio novo, que requer atenção das autoridades, tanto relativas à saúde pública como os mecanismos de controle da produção, distribuição e uso desta substância bio-neuro-psico-socio-genético-tóxica.

 

 

*Psiquiatra Pablo Miguel Roig, CRM 24968, criador e  diretor  da  Clínica  Greenwood, referência no tratamento de  dependentes de drogas no Brasil, na  Argentina, nos  Estados Unidos e na  Espanha

Dr. Pablo Roig: “Preconceito ainda marca a dependência de drogas,uma doença do cérebro”

Artigo do psiquiatra Pablo Miguel Roig, CRM 24968*

 

A dependência química é uma patologia que podemos considerar recente, não em relação a sua existência, e sim, devido a que só nos últimos tempos foi encarada como uma doença em seu tratamento e sua compreensão.

Na década de 50 do século passado, o Dr. Elvin Morton Jelinek, referência no estudo do alcoolismo, escreveu um livro cujo título é “The Disease Concept of Alcoholism”, dando uma clara noção que este conceito não estava internalizado, nem sequer pela sociedade científica. O conceito de doença…

 

A ciência conseguiu modificar alguns preconceitos ligados a doenças que mais que entidades nosológicas, eram vistas como maldições divinas, problemas de caráter, influência de maus espíritos etc. Temos como exemplos a lepra, que atualmente denomina-se Hanseníase em função da carga preconceituosa que os leprosos suportavam, a epilepsia, que estigmatizou os portadores da doença, dando um significado místico às convulsões, a depressão, que até consolidar o conceito biológico deste mal, tinha-se o conceito de ser um transtorno de caráter. São patologias que, na atualidade, não são colocadas como sendo de responsabilidade do doente ou de influências místicas. Nas adicções, a situação continua  carregada de preconceito, talvez pelo fato de que sua sintomatologia tem muito de condutual. O uso das drogas, tanto lícita como ilícitas, vem acompanhada de ruptura de regras e normas de interação social.

          Psiquiatra Nora  Volkow, Diretora do National Institute on Drug Abuse 

Estudos recentes mostram que a dependência química é uma doença do cérebro como é frequentemente afirmado, com apoio em trabalhos científicos incontestáveis, pela Dra. Nora Volcow. As drogas, quando usadas precocemente impedem o amadurecimento cerebral e seu uso continuado altera a relação de diferentes áreas do sistema nervoso central, modificando o equilíbrio entre o desejo, sua avaliação e a realização do ato. Mudam os critérios valorativos, as prioridades e transformam o adicto em um ser imediatista e impulsivo. É claro que esta é a descrição de um indivíduo com sua existência reprovável, mas não esqueçamos que ficar doente não é uma escolha do paciente e que tem uma série de fatores que influenciam a gênese desta patologia como os genéticos e os epigenéticos.

Não é infrequente que os serviços da saúde rejeitem pessoas que vem solicitar atendimento, ao se tratar de adictos.Pessoas não preparadas, incluindo profissionais da saúde, recusam-se a atendê-los, já que não é uma patologia que inspira simpatia nem acolhimento. Esta reação prejudica o processo terapêutico que somada à resistência social, ao despreparo do sistema de saúde e à tendência do paciente de negar a realidade que o acomete, por ser insuportável para ele aceitar ser portador de uma patologia tão humilhante, provoca a ineficiência dos esquemas terapêuticos para a doença. Como resultado, uma pequena porcentagem dos atingidos vem pedir ajuda de própria e espontânea vontade.

Um trabalho que apresentei no Congresso Argentino de Psiquiatria no ano 1978, quando ainda era residente do serviço de Psiquiatria do Hospital Italiano de Buenos Aires, visava a identificar os pacientes com uso excessivo de álcool que estavam internados em um simples dia na instituição. Usamos na época o questionário do Dr. A. Grimson e com a ajuda de todos os residentes pudemos interrogar a 500 pacientes em 24 horas. Nossa surpresa foi encontrar que 20% dos internados aplicavam como bebedores problema e alcoólicos. Nesta época, eu coordenava a equipe de alcoolismo do Hospital e éramos procurados por pacientes diretamente ou recebíamos indicações de outros especialistas. Por se tratar de uma instituição de alta complexidade com diferentes especialidades contávamos com as derivações de colegas de outras áreas da medicina. Mesmo com o potencial de pacientes que o Hospital tinha, atuávamos no máximo em nosso serviço, com o irrisório número de 6 a 8 pacientes. 20% de 500 é 100 em um dia só de pessoas que poderiam beneficiar-se de programas de prevenção e tratamento que não eram encaminhados a um setor específico!!! Vemos aqui a resistência de possíveis pacientes, dos profissionais da saúde e das próprias famílias que sentem a vergonha como motivação para sua atitude. Uma avaliação simples nos levou a perceber que os pacientes que procuram nossa ajuda, geralmente tem sua consulta induzida, quando não tem mais como negar e que geralmente passaram vários anos (de 5 a 8) consultando-se com qualquer especialista, menos o específico, formado e preparado tratar adicções.

É necessário rever nossa ótica em relação à dependência química. É uma doença como as outras, que tem agente etiológico, diagnóstico, prognóstico e tratamentos eficientes, que dependem de profissionais formados especificamente e que tem por função fazer parte de equipes multidisciplinares de abordagem múltipla pela complexidade e a característica multifacética da patologia. O processo de acolhimento e reinserção social, é de extrema importância. Ver os pacientes e suas famílias com compreensão e compaixão faz parte importante do tratamento, já que um fator de recaída sempre presente é a marginalização da vítima da doença.

 

*PSIQUIATRA PABLO MIGUEL  ROIG,  CRM 24968,   criador e  Diretor  da  Greenwood, clínica  referência no tratamento de dependentes de drogas  no Brasil,  na  Argentina, nos Estados Unidos e na Espanha.  

 

Cracolândias e o não cumprimento da lei federal 13.840,que completa um ano hoje, aumentam nestes tempos da COVID-19 os riscos para mães de dependentes de drogas no Brasil

Artigo assinado pelo psiquiatra Pablo Miguel Roig,CRM 24968,dra.Eloisa Arruda e pelo Presidente da FEAE, Miguel Tortorelli***, que participam da campanha “PAIS CONTRA AS DROGAS”

 

Foto: Carlos Torres// cracolândia da Lu, centro de SP

Na São Paulo das cracolândias, onde é fácil conseguir droga, mães de dependentes são grupo de alto risco para a Covid-19. São senhoras de 60, 63, 66 anos que estão isoladas em seus apartamentos ou casas, mas de madrugada, recebem telefonemas para irem buscar filhos jogados nas ruas sob efeito de drogas. Ou são informadas por interfone que filhas estão em táxis nas portas de seus condomínios, com motoristas cobrando e advertindo que estavam na região da cracolândia. Muitas vezes, esses dependentes ficam cinco, seis dias fora de casa usando drogas e, depois, retornam podendo contaminar suas mães porque estiveram em locais de alto risco para o novo coronavírus.

                                                                        Psiquiatra Pablo Miguel Roig

Retrato preocupante do que ocorre em São Paulo e em 85% das cidades brasileiras com cracolândias, conforme números da Confederação Nacional dos Municípios.Cidades que ignoram a lei federal antidrogas 13.840/2019, que está completando UM ANO hoje,5 de junho. Lei que estabelece o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e define as condições de atenção aos usuários ou dependentes e autoriza pais a solicitarem a psiquiatras até a internação involuntária de filhos em hospitais do SUS, quando está colocando em risco sua vida e a de terceiros, como os que e estão em cracolândias.

                                                                           Doutora Eloisa Arruda

Dependência de droga é doença que desestrutura de tal forma o cérebro, que a droga passa a ser prioridade. Cada dependente afeta pelo menos 10 pessoas de seu entorno,causando separação, medo e violência. Entidades que orientam e prestam assistência a familiares de dependentes de drogas, como a Federação de Amor-Exigente, têm constatado o aumento dos casos no Brasil de mães aflitas que,nestes tempos de pandemia,buscam internação involuntária para recuperar os filhos mas enfrentam imensas dificuldades na rede pública pelo não cumprimento da lei 13.840/2019.

                                        Miguel  Tortorelli, Presidente da  Federação  de  Amor-Exigente 

O isolamento forçado, como o que estamos vivendo, é também campo fértil para o agravamento do consumo de drogas tanto lícitas como ilícitas, causando ou agravando quadros de depressão,ansiedade, insônia, violência doméstica e divórcios.E drogas,em sua maioria,agem negativamente em relação à imunidade, sendo que esta é de total importância como elemento protetor contra o novo coronavírus, que causa a COVID_19. Opiáceos claramente diminuem a imunidade, assim como outras drogas que modificam o equilíbrio biológico dos usuários. Drogas fumadas, como a maconha, o crack e o tabaco em cigarro, narguilé, charuto,cachimbo e cigarro eletrônico provocam inflamação das vias respiratórias, facilitando, portanto, o efeito agravante do novo coronavírus que ataca os pulmões. Nas cracolândias, além da droga fumada, há aglomeração e muita sujeira, facilitando, portanto, a contaminação.

Lei prevê também a possibilidade de internação compulsória, quando familiares não são localizados mas o dependente tem surtos psicóticos pelo uso de drogas nas ruas.Importante esclarecer que todos os tipos de internação devem ser informados ao Ministério Público, à Defensoria Pública e a outros órgãos de fiscalização.

Portanto, enquanto a lei 13.840/2019 não for cumprida, a dor vai substituir o amor, além de colocar em risco mães de dependentes que não encontram amparo na rede pública de Saúde para recuperar filhos dependentes de drogas.

**Psiquiatra Pablo Miguel Roig, CRM 24968, especialista há 42 anos no tratamentos de dependentes de drogas e diretor da Clínica Greenwood;, referência para psiquiatras do Brasil, da Argentina, dos Estados Unidos e da Espanha.,

***Doutora Eloisa Arruda Professora de Direito Processual Penal da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (graduação e pós graduação), que foi Secretária Municipal de Direitos Humanos e Cidadania de São Paulo (2017-2018) e Secretária da Justiça e da Defesa da Cidadania do Estado de São Paulo (2011-2014);

***Miguel Tortorelli, Presidente da Federação de Amor-Exigente, que atende e orienta , gratuitamente, por ano, um milhão e 200 mil famílias de dependentes de drogas no Brasil.

Doutor Pablo Roig: “É epidemia, mas dependência de droga ainda não é disciplina nas faculdades de Medicina”

“Dependência de droga é doença do cérebro e epidemia no Brasil. Mas AINDA não é disciplina nas faculdades de Medicina em todo o país e não recebe do Ministério da Saúde e nem dos governos estadual e municipal investimentos necessários à criação de programas de prevenção e tratamento que, de fato, evitem os casos e recuperem estes graves doentes no Brasil.” Análise do psiquiatra Pablo Miguel Roig, CRM 24968 ,nesta terça-feira, na live “Prevenção e tratamento”. promovida pelo terapeuta Roberto Brunelli no Instagram e assistida por profissionais e familiares de estados brasileiros. Roberto Brunelli é o criador da FEBRACI- Federação Brasileira de Clínicas Terapêuticas Involuntárias. O doutor Pablo Roig tem em seu currículo 42 anos de experiência no tratamento de dependentes de drogas , é o criador e Diretor Clínico da Greenwood, clínica referência para psiquiatras no Brasil, na Argentina, nos Estados Unidos  e na Espanha. O doutor Pablo e Roberto Brunelli participam da campanha “Pais contra as drogas”

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No Brasil, 85% dos municípios têm cracolândias, denuncia a Confederação Nacional dos Municípios informando que o uso do crack prejudica nessas cidades EDUCAÇÃO, SAÚDE E SEGURANÇA. Adolescentes fumam maconha e já experimentam outras drogas, como cocaína, lança-perfume e ecstasy, oferecidos por colegas de festas, condomínios e de escolas.”Mas a dependência de droga, pela desinformação, ainda é vista pela população com preconceito porque o dependente tem conduta reprovável”,  avalia o doutor Pablo Roig. ” E, por desinformação, as famílias demoram de cinco a sete anos para encontrarem tratamento eficaz para tratar filhos ou parentes dependentes químicos.”

O doutor Pablo explicou que o tempo de tratamento “depende do diagnóstico médico e que  é necessária a abstinência”. Contou que na Greenwood , há 80 profissionais para tratar 30 dependentes “ e que nestes tempos de COVID-19 foi feito um Protocolo para evitar a contaminação e contratado um infectologista para acompanhar todo o trabalho de prevenção.

ASSISTA :

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Uma conversa sobre Dependência Química no Brasil. 02/06/2020

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Dúvidas sobre drogas? Dr. Pablo responde amanhã em live no Instagram

“Prevenção é arma riquíssima contra drogas”, defende o psiquiatra PABLO ROIG, CRM 24968,que participa AMANHÃ,dia 2,da live “Prevenção & Tratamento”, ÀS OITO DA NOITE, NO INSTAGRAM.  ´SERÁ  COM ROBERTO BRUNELLI, CRIADOR DA FEBRACI- FEDERAÇÃO BRASILEIRA DAS CLÍNICAS TERAPÊUTICAS INVOLUNTÁRIAS. PARTICIPE FAZENDO PERGUNTAS.

O doutor Pablo Miguel Roig  é médico formado na Faculdade de Medicina de Santos, em São Paulo, fez especialização em Psiquiatria no Instituto Italiano de Buenos Aires, na Argentina. Depois, em dependência de álcool e outras drogas na Adiction Research Foundation, no Canadá, centro referência da Organização Panamericana de Saúde. Em 1986, fundou a Clínica Greenwood, em Itapecerica da Serra, município paulista, tornando a Greenwood clínica referência para psiquiatras no Brasil, na Argentina, nos Estados Unidos, na Espanha e em Portugal.

Com o isolamento na pandemia, aumenta o uso de drogas

Artigo do psiquiatra Pablo Miguel Roig, CRM 24968*

Para comentarmos a situação atual das drogas, na convivência com uma pandemia, ainda nos faltam dados fidedignos, já que se trata de uma realidade recente, imprevisível e contaminada por medidas de combate muitas vezes contraditórias e incoerentes. Não podemos ignorar a influência que esta doença tem em nossas vidas, provocando mudanças qualitativas e quantitativas com impacto importante na nossa estrutura psíquica. Temos que restringir nossa liberdade de ação, vivemos com a angústia de sermos infectados, de morrer, de sofrer perdas de nossos entes queridos, de perder o emprego, de não poder pagar as nossas contas e de não saber quando isto vai acabar. Somos bombardeados diariamente com notícias que acabam funcionando com técnicas terroristas e vemos como isto é aproveitado por psicopatas de todas as ordens. Estamos sendo roubados de recursos essenciais para o combate ao vírus. Estamos presenciando o manejo político da pandemia. Vemos como a miséria humana é usada para benefício de alguns, falsificando produtos, roubando materiais, superfaturando compras e empreitas e tudo está ao alcance de nosso conhecimento em forma imediata, pela rapidez com que a informação nos atinge.

Pandemia está causando depressão, insônia, violência doméstica e divórcios”

Recentemente, ao comentar um artigo da Organização Mundial da Saúde sobre os efeitos psiquiátricos da pandemia, verifiquei que a partir da medição de consequências em vários países, encontraram um aumento significativo de quadros de depressão, uma piora nos que já vinham sendo tratados e agravamento dos quadros de ansiedade e insônia. Aumentaram também as denúncias por violência doméstica, feminicídio e divórcios. As crianças, além de serem vítimas de descuido ou mesmo agressão física ou psicológica, apresentam, em função do isolamento, dificuldades em relação à atenção, à motivação e ficando extremamente inquietos. Também houve um aumento importante no uso de drogas psicoativas lícitas e ilícitas.

Vamos nos concentrar neste último ponto. Para entendermos a relação do indivíduo com as drogas é importante compreendermos que elas provocam alterações cerebrais que trazem benefícios imediatos, principalmente na área da recompensa emocional e do manejo de ansiedades, do sono, das dores e provocam estados de euforia. As consequências mediatas passam a ser desconsideradas e o presentismo passa a ser a forma de funcionar do usuário, que procura a resposta satisfatória e rápida em forma inconsequente. Desta maneira vai se desenvolvendo a doença, que vai escravizando a sua vítima, que, desarmada de elementos psicológicos, chamados mecanismos defensivos, que mediem as emoções, usam o efeito imediato dos fármacos para aliviá-las, não importando os efeitos tóxicos transformando as drogas nos recursos defensivos espúrios.

Com o isolamento forçado, aumenta o consumo de drogas lícitas e ilícitas”

Uma situação como a que estamos vivendo, com o isolamento forçado, é campo fértil para o agravamento do consumo de drogas tanto lícitas como ilícitas. Mesmo os que não desenvolveram a doença, estão no grupo de risco, já que os consumidores moderados, talvez não consigam voltar ao uso do padrão anterior após a pandemia. A solução tóxica para o manejo das emoções provocadas pela situação atual é de uma ineficiência total, já que o efeito farmacológico só se obtém enquanto o indivíduo está intoxicado, deixando em muitos casos, posteriormente,  a famosa “ressaca”, que geralmente aumenta o que o usuário tentou diminuir, criando mal-estar físico, aumento da ansiedade, irritabilidade, agressividade, depressão, etc.. Na procura da solução imediata e química destes sintomas, instala-se o círculo vicioso do uso compulsivo e inconsequente.

As drogas, em sua maioria, agem negativamente em relação à imunidade, sendo que ela é de total importância como elemento protetor contra o vírus. Além de atuarem na diminuição imunitária, como é registrado em usuários de opiáceos, muitas delas são fumadas, como o crack, o tabaco em todas as suas formas, o cigarro eletrônico, os canábicos, etc.. Todas elas provocam inflamação das vias respiratórias, facilitando o efeito agravante do vírus no local de maior potencial destrutivo.

Descaso com cracolândias, onde estão grupos de alto risco para a COVID-19”

Uma preocupação que deveria ser de todos é a situação das cracolândias, esse submundo do qual temos poucas informações, mas que é um setor de nossa sociedade. Publiquei minha aflição no Blog da Clínica Greenwood, num artigo cujo título é “Os Descartáveis”, em que denuncio o descaso das autoridades, e de toda a sociedade, em relação a este drama que atinge a todos nós e critico a utilização política, com a promessa de dar uma solução para o problema, que fez parte do discurso de todas as últimas campanhas eleitorais. Os frequentadores das cracolândias cumprem com todas as características do grupo de alto risco. Usam uma droga fumada, que inflama os tecidos do sistema respiratório, não respeitam critérios mínimos de higiene, estão em ambientes de permanente aglomeração e estão imunodeprimidos pelo uso das drogas. Claro que não temos dados a esse respeito, porque ninguém sabe o que acontece nesse meio, mas podemos prever que acontecerá uma catástrofe de proporções gigantescas. Não devemos fechar os olhos para este drama.

É evidente que a situação atual é polifacetada e ainda estamos estudando a conduta do vírus, sua patogenia, os elementos de prevenção para a doença, tanto os primários, materializando-se numa vacina, como os secundários, com métodos diagnósticos e recursos terapêuticos para ação nos estágios precoces da doença e os terciários, com meios que ataquem a doença instalada independentemente da gravidade. Além disso, devemos observar as consequências a médio e longo prazo, onde a psiquiatria e o cuidado com adictos terão um papel preponderante.

*Psiquiatra Pablo Miguel Roig, Diretor da Clínica Greenwood, é especialista no tratamento de dependentes de drogas há 42 anos e se tornou referência no Brasil, na Argentina, nos Estados Unidos, na Espanha e em Portugal.

ESTERÓIDES ANDROGÊNICOS ANABOLIZANTES (EAA)

Artigo do psiquiatra Pablo Miguel Roig, CRM 24968 ***

 

 

Em um artigo do NIDA, revisado em 2018 na página Drug Facts, sob o título “Anabolic Steroids”, vemos como o uso destes fármacos tornou-se uma preocupação na área da saúde pública. Encontramos sintonia com o descrito e com nossa experiência terapêutica. Usarei os conceitos da publicação, com alguns comentários baseados em achados no nosso trabalho na Clínica Greenwood.

O termo usado no título, refere-se aos fármacos que resultam das variações sintéticas do hormônio testosterona. Anabolizante por ser responsável pela produção muscular e androgênico por aumentar as características sexuais masculinas.

São substâncias que se usam terapeuticamente nas puberdades tardias, no câncer e AIDS, mas halterofilistas fazem seu uso tóxico, na procura de aumentar a performance e melhorar seu aspecto físico. Sua aplicação é maior em homens entre os 20 e 30 anos, que consomem dosagens de dez a cem vezes mais que o indicado por médicos.

O uso dos produtos, que tanto podem ser incorporados em forma oral, injetável nos músculos ou por absorção dermatológica com gel ou pomadas, é sempre excessivo.

As maneiras de emprego geralmente respondem a alguns padrões:

– Tomando doses múltiplas por um período, suspendendo o uso e reiniciando após um tempo;

– Combinando dois ou mais diferentes esteróides e misturando a forma oral com a injetável;

– Aumentando as doses de uso patológico até atingir o pico e diminuindo progressivamente até chegar a zero;

– Alternar ou substituir um esteroide por outro para evitar o desenvolvimento de tolerância.

Nenhum destes métodos reduz a possibilidade de consequências sobre a saúde..

Os EAA não têm o efeito sobre o sistema nervoso central que têm os estimulantes. Não aumentam a liberação de Dopamina no sistema límbico, portanto não ativam o centro da recompensa, evitando os efeitos emocionais a curto prazo. Por outro lado, podem levar a efeitos mentais negativos como:

– Paranoia s zelotipia;.

-Extrema irritabilidade e agressividade;

– Ilusões;

– Julgamento alterado;

-Mania;

-Séria alteração do esquema corporal;

-Alterações de identidade.

 

Outras alterações na saúde dos usuários são:

-Acne;

-Sudorese excessiva nas mãos e pés;

-Alterações renais;

-Lesões hepáticas e tumores;

-Aumento do volume cardíaco, hipertensão, alterações no colesterol sanguíneo, fatores que aumentam o risco de AVC e ataque cardíaco até em jovens.

 

Alterações divididas por gênero e faixa etária são:

Para homens:

– Diminuição testicular;

– Diminuição da contagem de esperma;

-Calvície;

– Desenvolvimento de seios;

– Aumento do risco de câncer de próstata.

Para mulheres:

– Aumento dos pelos da face e do corpo;

-Diminuição do tamanho dos seios;

– Calvície de características masculinas;

– Alterações menstruais;

-Aumento do clítoris;

-Agravamento da voz.

Para adolescentes:

– Interrupção do crescimento;

– Diminuição da altura quando os EAA são usados antes da interrupção biológica do crescimento.

Os EAA têm uma característica que relaciona seu uso ao das outras dependências, apesar de não provocarem o “high” como os estimulantes. Os usuários continuam seu consumo, mesmo enfrentando os efeitos do mesmo. Enfrentam as consequências físicas, o alto custo da droga e os efeitos negativos em seus relacionamentos. Pesquisas mostram que são propensos a desenvolver outras adicções como a dos opiáceos, para combater a insônia e a irritabilidade causadas pelos esteróides.

Também podem apresentar sintomas de abstinência ao interromper o uso, que incluem:

-Fadiga;

-Inquietude;

-Perda de apetite;

-Alterações do sono.;

-Diminuição da libido;

-Fissura por esteroides.

-Depressão que pode levar ao suicídio.

O tratamento deve ser realizado através de psicoterapia comportamental e fármacos que ataquem os sintomas de retirada. Antidepressivos e analgésicos são uteis, assim como medicamentos para compensar as alterações endocrinológicas.

Frequentemente, em nossa experiência terapêutica, vemos uma combinação dos EAA com drogas psicotóxicas, o que é indicação, em muitos casos, de internação para ajudar nossos pacientes a recuperar sua autonomia, reorganizar prioridades, melhorar sua condição física, organizar seu esquema corporal distorcido e equilibrar seu sistema familiar e social, sabendo que o recurso mais eficiente é a abstinência absoluta de substâncias bio-neuro-psico-socio-tóxicas.

*** PSIQUIATRA PABLO MIGUEL ROIG- especialista com experiência de 42 anos no tratamento de dependentes de drogas e Diretor Clínico da Clínica Greenwood. CRM: 24968
e-mail greenwood@greenwood.com.br

Respostas às perguntas da live “Cracolândia: Dependência Química em Tempos da Covid-19”!

Respostas às perguntas da live

“Cracolândia Dependência Química em tempos da COVID_19”

promovida pela Liga Acadêmica de Psicanálise e Psicopatologia:

 

 

RESPOSTAS DO PSIQUIATRA PABLO ROIG, CRM 24968, Diretor da Clínica Greenwood

Jair Batista – E se o usuário não quiser o tratamento?

Geralmente os pacientes fazem uso da negação como mecanismo psicológico de enfrentamento das dificuldades provocadas pela doença. Também responsabilizam os outros pelos seus fracassos, projetando as dificuldades e consequências geralmente na família. Sabemos que esta solução espúria é ineficiente para lidar com o problema, só posterga a solução. Em média, nossos pacientes demoram de 5 a 8 anos para procurar tratamento específico, apelando a pseudotratamentos que não observam a total abstinência como programa terapêutico. Este processo e chamado pelo especialista, Prof. Eduardo Kalina como aperfeiçoamento e não tem verdadeiro valor de reabilitação.

Quando a situação é crítica, com risco para o paciente e os que o circundam, a internação compulsiva tem o objetivo de proteger o paciente e seus achegados. O que deve ser feito é oferecer inicialmente ajuda para aceitação espontânea, implicando a participação de quem tenha influência sobre ele e solicitar a colaboração, para orientação, de grupos de ajuda mútua com Amor Exigente.

2)– Bella Sousa Santos – O cérebro estaria funcionando de maneira “errada” por buscar sempre o mecanismo que nos faz mal? Tu poderia explicar essa questão novamente, por favor Dr. Pablo?

Nosso cérebro tem diferentes áreas com diferentes funções. Na evolução das espécies, os humanos fomos desenvolvendo o Córtex, como a região das funções mais sofisticadas para os valores de nossa espécie. A área límbica, que está na região central de cérebro, tem no Núcleo Acuminado (NA) a função de identificar experiências de recompensa, com a sensação de prazer. Isto se dá graças a liberação de um neurotransmissor chamado Dopamina (DA). Para ter noção deste mecanismo, usaremos alguns exemplos.

Se comemos ao estar com fome, registramos a sensação de prazer ao nos alimentarmos, liberando 50% a mais de DA no NA, se temos uma boa relação sexual liberamos 100% de DA, ao usarmos cocaína, liberamos 500% de DA, com nicotina 250%, com anfetaminas 1.000%, com crack 900%, isto em números aproximados. Como podemos imaginar, a experiencia do contato de estimulantes com o nosso Sistema Nervoso Central (SNC) se transforma numa situação incomparável com qualquer vivência pela intensidade do efeito. Com a repetição do contato, o cérebro vai modificando seu funcionamento, exacerbando a função límbica e prejudicando a função cortical, que é a que consegue controlar nossa impulsividade com a avaliação de consequência de nossos atos. Mudam-se as prioridades e valores, passando a colocar a obtenção de drogas que repitam a imensa sensação de prazer, mesmo que por tempo curtíssimo, apesar das consequências que enfrentarão.

Nada tem significado se não está ligado à intensidade de prazer, mesmo que a qualidade dele seja pífia pelas consequências do consumo. A droga passa a ser a motivação central se suas vidas, custe o que custar, levando os usuários a uma vida de perdas constantes, solidão, fracasso e finalmente e não excepcionalmente à trágica morte.

3) Silvia Maria Lopes de Mello – Temos uma situação complicada visando o isolamento social, durante essa pandemia, em função do isolamento. Como resolver esse impasse pensando na dependência?

Em tempos de COVID-19, estamos vivendo dia a dia, já que se trata de uma situação inusual. Sabemos dos inconvenientes do isolamento e suas consequências em nossa vida psíquica e social. Já verificamos um aumento significativo do uso de drogas psicoativas, principalmente de álcool, aumento de quadros de ansiedade e depressão, aumento da violência doméstica e outas consequências do isolamento. As drogas têm a função, para o usuário, de mediar as emoções, mesmo que isto seja de uma ineficiência total, pelo fato de que o efeito desejado, quando obtido, só acontece enquanto o usuário está intoxicado. Não esqueçamos que as drogas de eleição são, neste caso, as de ação e metabolização rápidas promovendo um uso de repetição compulsiva. Algumas drogas têm seu efeito psicológico interrompido após alguns minutos.

Depressão, ansiedade e alcoolismo em tempos de isolamento por COVID-19

Artigo do psiquiatra Pablo Roig, CRM 24968, Diretor da Clínica Greenwood

 

Temos observado na Clínica Greenwood, em tempos de isolamento, um aumento significativo de patologias psiquiátricas , tanto em sua frequência como em sua intensidade. Pacientes que tinham seus quadros controlados tiveram que aumentar seus recursos farmacológicos e retomar a administração e intensificar sua atividades terapêuticas. Verificamos a intensificação, principalmente, em depressões, quadro de ansiedade e pânico, alterações do sono e aumento do consumo de álcool, tabaco, psicofármacos geralmente ansiolíticos ou indutores do sono. Também notamos um aumento na procura por internação pelo uso de substâncias ilegais. Observamos, em muitos casos, que os pacientes traziam nas consultas queixas em relação ao cônjuge, pais, filhos ou outras pessoas de sua convivência e em alguns casos relatavam intolerância e violência doméstica.

Em concordância com os nossos achados, no 14 de maio a Organização Mundial da Saúde publicou artigo , que enfatiza o impacto direto ou indireto da pandemia na estrutura psíquica da população de diferentes países, mostrando a necessidade de altos investimentos na área da saúde mental. Identificam os efeitos do isolamento social, o medo ao contágio a possibilidade de perda das pessoas próxima e o estresse provocado pela diminuição de renda e perda do emprego como elementos a considerar seriamente pelo seu impacto emocional.

Notam-se números alarmantes de acréscimo de patologias como a depressão e a ansiedade que é mais significativa nas pessoas que trabalham na línha de frente, que enfrentam períodos intensos de trabalho, tendo que adotar decisões de vida ou morte e com a ameaça constante do contágio. Como exemplo, na China, o relatório refere que os trabalhadores da saúde apresentam depressão em 50% dos casos, ansiedade em 45%, insônia em 34%. No Canadá 47% dos ligados à saúde precisaram de suporte psicológico.

Crianças e adolescentes apresentaram dificuldades de concentração, irritabilidade, inquietude e nervosismo. Também frequentemente são testemunhas ou sofrem violência doméstica, com a política de “fique em casa”.

Outros grupos de risco relatados são as mulheres, que modificaram suas vidas em função do vírus, com os filhos estudando em casa, home office e tarefas de administração do lar. Atinge também jovens com comorbidades psiquiátricas principalmente.

Registrou-se o aumento de consumo de álcool, que em Canadá foi de 20% em indivíduos com idades entre 15 e 49 anos.

Em vários países as instituições para tratamento de pacientes psiquiátricos foram desviadas para o tratamento de COVID-19 apesar do aumento da demanda destes casos. Grupos de ajuda mútua foram impedidos de funcionar.

O Dr. Tedros Adhanom Ghebrejesus alerta para a importância de tratar o tema da saúde mental com a seriedade devida, destacando a responsabilidade que os governos e a sociedade civil com o apoio do sistema das Nações Unidas tem, para cuidar o bem estar emocional da população, com o risco de, ao não fazê-lo, tenhamos consequências sociais e econômicas de longo prazo.

Em diferentes países estão se procurando soluções para abastecer a população de serviços de assistência psicológica como o atendimento telefônico, visitas em domicílio e métodos de comunicação virtual.

Ações comunitárias que reduzem a solidão dos mais vulneráveis devem ser mantidas, assim como as que solidariamente se orientam para as necessidades básicas da população.

Coerentemente, neste artigo, na palavra de Devora Kestel, está a esperança de que o que aprendemos na pandemia e as modificações relativas ao enfrentamento das patologias psiquiátricas deixem uma herança de maior eficiência para tratar do tema.